O termo Clostridioses refere-se a uma série de enfermidades e intoxicações causadas por bactérias patogênicas do gênero Clostridium. O agente causa doenças que são responsáveis por um grande número de mortes, principalmente na pecuária extensiva. Quem pesquisa essas doenças e entende que mais importante que os tratamentos são as medidas profiláticas associadas às vacinações, é o grupo de pesquisa do professor Francisco Carlos Faria Lobato, do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva da Escola de Veterinária da UFMG. Há 27 anos, o grupo trabalha com todas as linhas em relação a essas bactérias, desde o desenvolvimento de métodos de diagnostico até a criação de novas vacinas.
O trabalho coordenado pelo professor Francisco Lobato se iniciou na Escola de Veterinária em 1986, quando ele era aluno de mestrado, com o controle das vacinas clostridiais. O objetivo era avaliar a eficiência dessas vacinas comercializadas no país, para oferecer um serviço de qualidade aos médicos veterinários de campo. Concomitantemente a isso, foram produzidos insumos para o desenvolvimento de novos métodos de diagnósticos.
“Trabalhamos de forma continua na criação das vacinas e de todas as metodologias que empregam biologia molecular. Temos no nosso laboratório toda uma estrutura adequada para fazer esses trabalhos”, avalia o professor.
A primeira vacina testada pelo laboratório da Escola foi contra os toxóides botulínicos. O trabalho foi finalizado em 1989, coincidindo com um surto episódico de botulismo no Brasil com mortandade de mais de um milhão de bovinos, o que culminou no controle oficial dessas vacinas por parte do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
Desde então, o professor deu continuidade a essa linha de pesquisa, com o controle de praticamente todos os componentes antigênicos das vacinas clostridiais, como a inocuidade, esterilidade e potência. “Não foi surpresa para nós que os outros antígenos também tivessem comportamento similar ao que ocorreu com o toxóide botulínico, ou seja, as vacinas realmente não tinham uma boa eficácia. Desse modo, essa primeira linha de trabalho permitiu que o Ministério da Agricultura implantasse de forma gradativa o controle da qualidade das vacinas clostridiais”, explica.
Botulismo
São várias as enfermidades causadas por bactérias do gênero clostridium. Uma delas é o botulismo, causado principalmente por ingestão das toxinas botulínicas pré-formadas. A doença, que atualmente é endêmica e não mais epidêmica, acomete, geralmente, vacas em lactação ou gestantes com deficiência de fósforo. A falta desse mineral causa uma perversão do apetite no animal, chamada de osteofagia, que leva a ingestão de ossos e até mesmo de parte de animais mortos. E quando o cadáver está contaminado pela toxina, o animal possivelmente vem ao óbito. “Ela é a toxina de origem microbiana mais potente que se conhece”, diz Francisco Lobato. “Existem os soros botulínicos no mercado, mas têm que ser aplicados bem no início dos sintomas clínicos para ter resultados eficientes”, alerta.
As condições de risco para esses animais acontecem também quando recebem silagen, feno ou rações contaminadas com matéria orgânica em decomposição ou com cadáveres de pequenos mamíferos ou aves. “O produtor oferecia aos animais cama de frango – o que se coloca no solo do galpão onde se cria as aves – como suplemento alimentar. É uma fonte de alimento com a qual o animal pode se intoxicar,” explica Francisco Lobato. De acordo com o professor, para o controle do botulismo, o produtor deve se basear em mudanças de manejos, com a adequada suplementação mineral. Assim, evita-se que a doença ocorra de forma endêmica.
Apesar de essas medidas serem importantes, a vacina constitui-se como principal forma de controle dessa clostridiose de extrema relevância no Brasil. “Os animais devem ser vacinados a partir dos 4 meses de idade, a segunda dose deve ser aplicada de 4 a 6 semanas depois da primeira, e um reforço deve ser feito uma vez ao ano”, recomenda o professor.
Outro agente clostridial, o Clostridium difficile, teve seus primeiros diagnósticos já descritos no país, no laboratório da Escola, em 2011. O aluno de pós-graduação Rodrigo Otávio tem importante participação no diagnóstico desse agente responsável por quadros de enterocolite – inflamação do intestino delgado e do cólon, responsável por provocar cólicas, diarreia, vómitos, mal-estar e febre, nos animais como também no homem. “Estamos fazendo um trabalho em conjunto com o Hospital das Clínicas da UFMG, que permite diagnóstico humano do hospital aqui na Escola de Veterinária”, conta o aluno.
Clostridium difficile
A doença só foi entendida em humanos e animais a partir da década de 80. “Para a ciência, 30 anos é muito recente”, comenta Rodrigo. A doença foi descoberta no Brasil em suínos no ano de 2011 e em equinos no ano de 2012, no laboratório da Escola. Entretanto, não se tem conhecimento de quais são os animais reservatórios e de onde vêm as cepas. Em humanos, geralmente, ela tem uma associação com o uso de antibióticos e acomete pacientes imunossuprimidos que estão em unidade de terapia intensiva.
Os agentes podem estar no substrato gastrointestinal ou no ambiente. “O esporo desse agente é muito resistente. Por isso, é importante acertar no diagnóstico, principalmente nos humanos, pois isso evita que a doenças continue se disseminando”, explica o aluno.