A cidade de Nepomuceno, no interior de Minas, marcou profundamente a vida de Jarbas Juarez. Nascido em Coqueiral, o artista que hoje tem 83 anos migrou para o município vizinho quando ainda era um bebê. A infância e a mocidade passadas sob uma atmosfera interiorana foram levadas para a tela do pintor, mas de um modo muito particular.

“Não pinto a realidade, nada que é natural me interessa. Querer pintar a realidade é copiar, e a cópia é uma coisa vazia, sem valor. O poder criativo é trabalhar a nossa percepção sensorial. Pinto a minha realidade. Tudo o que fiz até hoje são coisas fictícias”, esclarece ele, que afirma nunca ter colocado um cavalete na rua. “Sou um pintor de ateliê”, diz.

Com uma formação diversificada, Juarez atuou como jornalista e editor gráfico da revista “Alterosa” e ilustrou várias publicações infantis, além do “Suplemento Literário de Minas Gerais Minas Gerais (original name) Minas Gerais ”. Na Escola de Belas Artes da UFMG, lecionou entre 1967 e 1994, quando se aposentou pela instituição. Antes de tudo, porém, foi aluno de Alberto da Veiga Guignard (1896-1962), de quem colheu uma das lições mais preciosas. 

“Com 20 anos, ele me abriu os olhos para a importância de, diante da natureza, a gente aproveitar os detalhes e utilizá-los em um lugar só”, destaca. As “panhadeiras de café” são um dos motivos recorrentes na arte de Juarez, que coloca na conta do “mineirismo” a inventividade de suas criações. “Uso a nossa mania de querer ter praia e não ter, coloco um Pão de Açúcar no meio do cafezal, misturo mar com montanha”, conta.

Ainda criança, Juarez foi vendedor de livros. A intimidade com a literatura jamais o abandonou, e é de lá que ele pinça nomes de sua admiração, como o russo Leon Tolstoi (1828-1910), da célebre frase “se queres ser universal, começa por pintar tua aldeia”, que o entrevistado garante levar a ferro e fogo ao pintar.

“Sempre usei elementos do barroco mineiro, mas sem preocupação com religião. O que me fascina é a arquitetura, o ornamento, a decoração. Meus cafezais trazem os relevos dourados dos nossos altares de igreja”, sintetiza ele, fã confesso da poeta Adélia Prado. “Ela fala do dia a dia, da comadre que vem pedir um ovo”.

Opiniões. Jarbas Juarez não é um tipo fácil. Até os 81 anos ele praticou caratê e, quando a saúde já não o permitia, substituiu a milenar arte marcial japonesa por bicicleta e musculação. “Para não ficar parado”, ele explica. Em outro campo da arte, a imobilidade tampouco o seduzia. Inquieto, Juarez se encantou pelas novas possibilidades da escultura quando, em 1973, teve acesso à publicação “Novo Processo da Escultura Contemporânea”, do norte-americano John Baldin. “Esse cara tinha um amigo na Nasa (agência espacial dos Estados Unidos) que o ensinou a utilizar fibra de vidro em poliéster”, informa Juarez.

Foi com esse material que o artista criou o boi que fica em frente à escola de veterinária da UFMG, símbolo do curso de graduação. Um trabalho sobre desenvolvimento embrionário, com o corte de um útero e uma criança em seu interior em tamanho natural, foi outro fruto da técnica inovadora. “Ninguém mexia com isso na época, a própria escola condenava, mas a função dela deveria ser incentivar a criatividade dos alunos. Hoje em dia todas as escolas de samba usam fibra de vidro em poliéster”, sublinha Juarez.

Outra característica é a franqueza. O pintor não esconde a tristeza com o fato de a reitoria da Escola de Belas Artes ter engavetado “sem nem desembrulhar” uma pesquisa sobre o material. A mesma sinceridade é usada para analisar a arte contemporânea. “Virou moda explorar o tátil, pisar em ovo, vidro, algodão. Essa é uma didática infantil”, diz ele, que têm trabalhado em colagens. “Sempre penso que vai ser o meu último ato”.

“Sou um aprendiz, só sei o que pelejo pra saber, na hora que eu falar que já sei pintar, estarei sendo um mentiroso, porque só quero aprender.” Jarbas Juarez 

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